terça-feira, agosto 21, 2007

O ESOTERISMO

O que é importante ocupar-se, em primeiro lugar, objetivando um esclarecimento sobre o assunto, é que aquilo que chamamos esoterismo não é na realidade um tema sobre o qual discorremos, da mesma forma tal quando falamos sobre um assunto específico. Na verdade, ao tratarmos de esoterismo estamos tratando de uma perspectiva que está acima da visão exotérica, ou seja, que não está acessível à pessoa comum e sua linguagem discursiva de cunho racional.

O esoterismo é uma ótica sob a qual se vê tudo de uma perspectiva mais alta. Pois tudo que existe possui uma face oculta e uma face aparente. Enquanto a vida transcorre de uma forma cotidiana, sem muitos questionamentos, as coisas se nos aparecem conforme suas realidades aparentes, ou seja, ligadas em sua dimensão espaço-temporal materializada. No entanto, a partir do momento em que existe uma modificação do ato de ver o mundo (entendendo este ver como forma de percepção cognitiva das coisas), percebe-se que existe uma face oculta, que é sua realidade intrínseca.

O esoterismo, neste caso, é o meio através do qual esta visão supra-material se tornaria acessível. Desta forma, o indivíduo humano, através de ensinamentos simbólicos (que é a forma com a qual são transmitidos os conhecimentos esotéricos), tomaria conhecimento de outras modalidades de ser que não apenas a sua. Ou seja, saberia que ele, no estágio em que se encontra, limitado por um corpo, não seria identificado apenas com este, mas que sua individualidade e seu corpo seriam apenas processos visíveis de algo muito mais abrangente (caso se possa dizer desta forma). Mais simplesmente dizendo, que não seríamos um corpo que tem um espírito, mas um espírito que tem um corpo, sendo aquele sua realidade transcendente.

A busca do esoterismo, portanto, tem como plano de fundo a perspectiva espiritual, sem confundir-se, contudo, com a religião, esta com caráter exotérico. Como se vê, aquilo que chamamos de esoterismo não se confunde com diversas coisas que os meios de comunicação insistem em chamar como tal. Muitas vezes confunde-se esoterismo com ocultismo, com religião, com misticismo, enquanto na realidade tais coisas não podem ser mescladas, pois dizem de realidades distintas, apesar de conexas.

O trabalho do esoterismo seria o de conduzir o homem para tomar contato com sua realidade transcendente (e, desta forma, com a realidade transcendente de tudo quanto há), que é a própria realidade universal, e, assim, tomar posse de seus tesouros superiores, que são a sua própria essência. As palavras de Paulo traduzem de forma clara essa assertiva: “Lembrai-vos que o Altíssimo habita dentro de vós”, ou seja, que esta realidade transcendente é o próprio Deus.

Os ensinamentos esotéricos têm sido, muitas vezes, perseguidos pelas autoridades exotéricas porque não são acessíveis às suas compreensões. Enquanto o homem é visto como um pecador pelos próprios exotéricos (sendo isto apenas uma perspectiva por onde se pode enxergar o próprio homem), pela perspectiva esotérica o homem é o canal para a manifestação da própria divindade (sendo que, de forma alguma, estas duas possibilidades nunca se chocam, pois tratam de estados diferentes; um, o homem enquanto ser moral, agindo no plano físico, material; outra, o homem enquanto ser espiritual, feito à imagem e semelhança de Deus).

Portanto, os ensinos esotéricos têm por objetivo buscar a aproximação do homem à sua própria essência, estabelecendo uma conexão firme com seus estados superiores. O motivo de tal busca tem como princípio e fim a Identidade Suprema, como os Upanixades se referem, ou seja, a união com Deus, a Realidade Única e transcendente. Enquanto as correntes exotéricas pregam a salvação como meta última do homem, o esoterismo entende que a salvação é uma das metas, mas não a suprema, ou seja: seria apenas um estágio, ainda que muito avançado e de altíssimo grau de realização, mas ainda assim ligado a esta realidade contigente. A meta última seria a Liberação, quando o ser individual extingue totalmente sua ignorância da Realidade Suprema e nela se funde.

O KARMA


Não erreis: Deus não se deixa escarnecer; porque tudo o que o homem semear, isso também ceifará.
Gálatas (6:7)

1 - Introdução

A princípio, o estudo do Karma tem por objetivo aquilo para o qual se prepara todo aquele que busca conhece-lo: A liberação final ou a Suprema Identidade. Entende-se por liberação final o fim último do homem que é o de unir-se a Deus. O Karma seria, sob este ponto de vista, tanto veículo para a libertação do homem, quanto sua própria prisão, dependendo da forma com que ele é veiculado.

Dentro da tradição hindu, assim como na Budista, a palavra Karma (Kamma – em páli), oriunda do sânscrito, tem seu radical na palavra Kr , que quer dizer ação. Na doutrina tradicional da Índia, portanto, a palavra Karma tem sua acepção mais comum como “ação”, e a mais avançada como “ação ritual”, quer dizer, a ação que obedece a verdadeira maneira de ser do homem, a ação que expressa a natureza essencial do ser.

Para uma clareza maior, não há possibilidade de se dar seguimento ao estudo do Karma sem se examinar o que os hindus querem dizer com a outra teoria justaposta, a do Darma (ou Dharma, ou Damma – em páli). Tal palavra, assim como a própria idéia que advém da palavra, pode ser traduzida como “maneira de ser”. Alguns querem vê-la como Lei.


2 - O Dharma

O Karma e o Darma são frutos da existência do tempo. O homem oriental enxerga o tempo de forma cíclica e tem o entendimento que as características principais da passagem do tempo se repetem. Assim como a Primavera, o Verão, o Outono e o Inverno são características cíclicas dos anos, e todos os anos se repetem, cada qual expressando sua singularidade, da mesma forma os antigos dividiam o tempo em ciclos, prefigurando um determinado padrão cósmico.


3 - Manvantara

Diversas tradições falam sobre esta divisão, sendo que um número que entendemos ser aceitável é o que a escola perenialista coloca, de cerca de 64.000 anos, referente ao movimento de precessão dos equinócios (inclusive é este o número que os babilônios entendiam que se referia a um ciclo).

Dentro deste ciclo, que seria chamado pelos hindus de “manvantara”, existe uma “maneira de ser”, ou de se expressar, que deve ser obedecida para que o ser que nele vivesse tivesse a melhor forma de orientação. Portanto, esta Lei (ou maneira de ser) chama-se Dharma.


4 - O Karma, propriamente dito.

O Karma, sendo ação, ou seja, expressão do ser humano, deve acontecer de acordo com a “maneira de ser” de cada ciclo. Normalmente, o karma é a expressão dessa maneira de ser. O afastamento desse é que se tornaria uma aberração, um afastamento do curso natural das coisas.

As tradições espirituais (ou simplesmente tradições) são as guias e orientadoras da maneira de ser de cada ciclo. Portanto, as formas tradicionais mostram qual caminho a ser trilhado para que o ser se mantenha dentro do dharma, e dele não se afaste. São elas, portanto, a tradução ao ser humano de qual é a vontade do Ser Universal, do Grande arquiteto do Universo – Deus, para ser seguida por todos os seres.

Esta lei vale para todos os seres, sejam animados ou inanimados. Mas, num sentido didático apenas, busquemos examinar o comportamento do Karma com relação aos homens.


5 - A Missão

Cada homem tem, dentro do plano Universal, uma função geral e uma singular, à qual os ocidentais chamam de Missão. A característica geral do homem o coloca no centro do Universo manifestado como o principal fator de irradiação da força divina. As tradições deixam isso claro a partir do momento em que dizem que o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus.

A característica singular é a ferramenta com a qual cada homem nasce para trabalhar no sentido de expressar a característica geral do homem, que é sua verdadeira essência. Ou seja: o caráter singular do homem é a ferramenta que ele tem para expressar o Homem verdadeiro que existe em seu interior. E quando ele age de conformidade com este caráter, ele expressa a verdadeira luz que está em seu coração.

A essa ação consciente que o homem tem em busca de expressar a sua verdadeira essência, que Jesus Cristo chamou “Reino de Deus”, e Sidarta Gautama chamou “Buda”, é o primeira explicação do que é karma, ou seja: Ação ritual; ação de conformidade às leis universais.


6 - Causa e Efeito

No entanto, a palavra Karma obteve, com o passar dos anos, e com a tradução ao pensamento ocidental outra conotação. Passou apenas a ser tão somente a “lei de causa e efeito”, ou seja: toda ação produz um resultado.

Não sendo, contudo, essa a principal perspectiva pela qual o Karma deve ser estudado, não se poderia passar por cima deste assunto sem que haja a abordagem.

Paulo escreveu em Gálatas (6: 1 a 7):

1 IRMÃOS, se algum homem chegar a ser surpreendido nalguma ofensa, vós, que sois espirituais, encaminhai o tal com espírito de mansidão; olhando por ti mesmo, para que não sejas também tentado. 2 Levai as cargas uns dos outros, e assim cumprireis a lei de Cristo. 3 Porque, se alguém cuida ser alguma coisa, não sendo nada, engana-se a si mesmo. 4 Mas prove cada um a sua própria obra, e terá glória só em si mesmo, e não noutro. 5 Porque cada qual levará a sua própria carga. 6 E o que é instruído na palavra reparta de todos os seus bens com aquele que o instrui. 7 Não erreis: Deus não se deixa escarnecer; porque tudo o que o homem semear, isso também ceifará.

Neste excerto, Paulo está falando exatamente da lei da causa e do efeito, ou seja, em linguagem popular: “Quem plantou abacaxi não pode colher mamão”. Mas, dentro dessa possibilidade kármica, existem muitas nuances que devem ser analisadas.


7 - Aspectos da Lei da Causa e do Efeito

A primeira é a seguinte: o que se planta se refere apenas ao aspecto externo da ação? Esta primeira pergunta deve ser respondida com um sonoro não. Tanto positiva quanto negativamente. O aspecto externo não traduz a relação cármica entre indivíduo-ação e efeito. Por exemplo: Jesus chicoteando os vendilhões e um feitor chicoteando os escravos. O que há de primordial nessa imagem? A intenção.

Apesar do dito popular dizer que “o inferno está cheio de boas intenções”, o que faz com que uma ação tenha valor cármico são os fatores que a produziram. E, neste caso, a intenção está na base do valor da ação. Um fariseu que ora em público e um fiel devoto que ora em silêncio, fazem a mesma ação, mas com qualidades diversas.

Portanto, o que se tem que ter em mente, em primeiro lugar, é que a ação em si mesma é destituída de um valor verdadeiro. O valor não está na ação em si mas, em primeiro lugar, na intenção com que se faz.

Mas se a intenção fosse o único fator para se valorar a ação, o dito popular não teria sua verdade. Portanto, entra um segundo fator que deve ser levado em conta no momento de se valorar a ação, que se chama Lei. A ação deve ser feita com a intenção verdadeira, e os olhos postos sobre a lei, quer dizer, o Karma não pode ser desvinculado do Dharma.


8 - Providência Divina, vontade Humana e Destino

Neste ponto de vista, adquirimos a visão de três fatores primordiais, que de forma alguma estão desvinculados, sendo aqui citados apenas por razão didática: A Lei, o Homem e a ação., que poderíamos colocar dentro dos seguintes aspectos utilizados pela tradição ocidental: Providência Divina, Vontade e Destino (ou Fatalidade).

A Lei provém do grande Arquiteto do Universo. Ao homem cabe a intenção, a expressão de sua vontade. A ação tem como fator determinante o objeto.

Por este motivo, quanto mais o homem, em sua ação, se aproxima da Lei, mais se afasta da fatalidade e domina seu destino. Quanto mais se afasta da Lei, mais preso estará pelos resultados de suas ações. Ou seja: a verdadeira liberdade não está em fazer o que quer, mas em escolher o que realmente deve ser feito, estar de acordo com a Lei, ou o Dharma.


9 - Ação sem buscar usufruto

A doutrina hindu também fala sobre o resultado das ações: o homem deve agir sem buscar usufruir os resultados. Dentro do pensamento oriental, quando o homem age já buscando um resultado, uma recompensa, a intenção já está falha e não produz o efeito desejado. Por isso a máxima: “Amar sem ver a quem”. Para o homem ocidental, tal perspectiva pode parecer, a princípio absurda. Porém, aquele que faz o bem em busca do paraíso, já obteve seu resultado. E aquele que faz o bem para fugir do inferno, também já obteve seu resultado. Desta forma, o caminho da perfeição, utilizando o Dharma está na ação desinteressada do bem. Rabi’a, adepta Sufi do séc. VIII, dizia o seguinte:

“Pela Tua força, ó Deus, eu não Te adoro porque desejo Teu Paraíso, mas por amor a Ti. Não é o Paraíso que eu passarei minha vida a procurar.”


10 – Conclusão

Concluindo, dentro da perspectiva oriental, o Karma é muito mais do que simplesmente a propalada “Lei de Causa e Efeito”, mas própria expressão da Lei Universal.

Que sou, sem tu mesma, em meu destino...

Que sou, sem tu mesma, em meu destino
Senão um insipiente pó desacordado?
Que é meu destino senão um dado
Jogado pelas mãos de um menino?

Desgarrado olhar que se me arvora
A escolher entre o cadafalso da ilusão
E um existir medonho, que apavora
O coração mais isento de emoção.

Somente tu me ergues, soberana de mim,
Pois em ti meu amor não tem fim
Sendo meu próprio coração tua glória.
Somente tu me amas, rainha da história.

E tanto neste amor vou transcendendo
Que a mim mesmo vou me vencendo!

Se perdôo tempo a tempo teu olhar...

Se perdôo tempo a tempo teu olhar
É porque reconheço-me em tua voz,
Em teu pulsar, como se fosses mar
Onde eu, rio, despejo minha foz.

Se perdôo tempo a tempo teu lábio
É porque meu coração transcende
E dentro de mim encontro o sábio
Pensamento que te compreende.

Portanto, de perdão e gratidão
Toda a nossa vida é feita
No umbral do Eterno.

Contigo, não existe mais solidão
Pois meu lábio a ti aceita
Neste sentimento terno.

A compreensão de que existo apenas...

A compreensão de que existo apenas
Quando encontro-me em teu olhar,
Tem me redimido de todas as penas
Pois em teu coração está meu lar.

Habita, pois, meu coração feito Luz
Ou feito pedra preciosa que atordoa:
Com seu brilho real que me conduz
Faz-me acreditar que meu amor voa.

Voa e me traz de mim a mim mesmo,
Como o verbo que encontra o lábio
Daquele que o pronuncia.

Contigo, já não estou mais a esmo,
Pois com amor o coração é sábio,
E a felicidade se anuncia.

domingo, abril 08, 2007

Considerações sobre a Felicidade

A importância de se ter paz interior é muito grande. Se atropelarmos as coisas, estamos sujeitos à infelicidade. Portanto, a riqueza inacessível às forças deste mundo é a fonte da paz, da luz e do amor.

Esta Fonte, aos olhos racionais, é um paradoxo, que deve ser sublimado pelo coração: ao mesmo tempo que se alteia de um plano aparentemente inacessível, ou seja, vem do alto, está depositada em nosso interior.

Neste caso, a expressão dela é que nos torna mais felizes, enquanto a sua supressão é capaz de nos liquidar.

Se todo homem busca sua felicidade, por qual razão esta felicidade se apresenta diante dele? Como pode ele compreender, dentro das misturas que a ilusão tenta fazer na realidade, o que é a verdadeira felicidade?

Está claro que toda pessoa constrói sua felicidade. Ainda que pareça, aos olhos dos outros ser infeliz, ainda assim, em seu interior, a pessoa pode ser feliz, porque a felicidade não é apresentável a este reino material, reino das quantidades, pois está acima da visão material.

Na simplicidade de visão, a felicidade se apresenta com uma aceitação interna da vida que se leva, ou, em outras palavras, é o estarmos bem conosco. Mas devemos observar que isto é apenas o sinal da felicidade se apresentando. Porque a felicidade, segundo posso ver, é expressarmos a Deus em sua perfeição. Ou, conforme diz Jesus: "Sêde perfeitos como vosso Pai celestial é Perfeito".

Portanto, em maior ou menos grau, a Divina Presença que existe em nossas vidas é quem torna factível o viver. É o Superior, que está em nós. Portanto, dentro dessa visão, a felicidade é termos consciência plena desta Divina Presença, o que só seria possível a partir do momento que a expressássemos.

No entanto, existe algo superior à felicidade, que não está acessível ao homem neste atual estágio de evolução: A união plena com Deus.

Uma vez eu estava meditando e buscava entender o que era perfeição... Então, veio-me uma visão: eu me vi dentro de um buraco escuro que eu entendi que era, na época, minha condição presente...

Nesse momento, vagarosamente, fui elevado para a boca desse buraco e, quando coloquei a cabeça pra fora, vi uma planície noturna e um céu estrelado.

Uma voz me dizia assim:” isso é a perfeição... apenas o começo da caminhada”.

Então, naquele momento, entendi que a perfeição que tanto falamos é quando o homem está preparado, pois a perfeição está em nós aguardando apenas ser expressada.

Neste caso, a princípio, o homem busca a felicidade como fiel condição de expressar sua natureza real e humana. Porém, chegará um momento que a felicidade já não será suficiente, porque somente a dissolução da Alma no Amado seria capaz de suprir tudo.

Quando Jó dizia: "minha alma tem tédio de minha vida", era, segundo o meu ver, a isso que ele se referia. Da mesma forma que São Franscisco fala: "É morrendo que se vive para a Vida Eterna". E da mesma forma que os místicos, sejam cristãos, mulçumanos ou judeus, entendem: "o que é vida para muitos, para mim é morte; e o que é morte para muitos, para mim é vida". Ou seja, a maior felicidade deste mundo ainda é pequena em comparação, se podemos dizer dessa forma, com o que nos espera em outros estados do ser.

terça-feira, fevereiro 06, 2007

Quem é o aprendiz? (2)

Quando eu escrevi um texto, em 04/10/2006, em que citei uma frase dizendo “quando o discípulo está pronto, o mestre aparece”, alguém escreveu dizendo que já tinha lido uma frase semelhante, mas de natureza diversa: “quando o discípulo está pronto, o mestre desaparece”.

Apesar de entender o sentido colocado pela frase, em que o discípulo pronto já não teria mais razão de ter um mestre, alguém que o guie, ainda assim vejo que a primeira frase seja mais completa, porque fala de dois pontos de vistas necessários. O primeiro, que já mencionei no texto de 04/10/2006; o outro seria o seguinte: O mestre que aparece é, caso se possa dizer assim, o “Si Mesmo” do próprio discípulo.

Desta forma, entende-se que a única função do Mestre (que é, talvez, a mais sublime missão de um homem enquanto tal) é de despertar o discípulo para sua essência, e fazê-lo enxergar que o Mestre que ele vê fora, também está dentro.

sexta-feira, janeiro 12, 2007

O que é um "símbolo"?

A vida é simbólica. Entendemos que a palavra “símbolo”, e suas derivadas, tem sido utilizada aquém de seu sentido primeiro, pois os símbolos não são necessariamente criações da mente humana. Esta, sim, é o instrumento capaz e necessário para se instruir através dos símbolos. E a vida, ao nosso redor, viceja de exemplos. Portanto, antes de adentrarmos nesta questão, vejamos o que entendemos por símbolos.

Hoaiss coloca a etimologia da palavra da seguinte forma: “um objeto partido em dois, em que dois hospedeiros conservam cada um uma metade, transmitida a seus filhos; essas duas partes comparadas serviam para fazer reconhecer os portadores e para comprovar as relações da hospitalidade contraída anteriormente”. Ou seja, a partir do momento em que duas pessoas juntavam suas respectivas metades, havia, neste caso, um sinal de reconhecimento. Silveira Bueno coloca a origem da palavra de maneira bem significativa; ela viria do grego symbolon, do verbo symballo – “eu comparo”[1].

A palavra reconhecimento também tem um aspecto a ser colocado. Reconhecer tem o significado de prestar ao objeto do reconhecimento uma validade, ou uma certificação. E, ao mesmo tempo, para que haja este reconhecimento, há a necessidade de um conhecimento prévio. Neste caso, a partir do momento em que o objeto do reconhecimento se encontra à disposição de nossa consciência, fazemos uma comparação com aquilo que temos em nosso interior com aquilo que percebemos externamente. Assim, para se efetuar o reconhecimento há a necessidade de um conhecimento prévio.

Temos então duas palavras que, juntas, conformam um entendimento: símbolo (duas metades de uma coisa) e reconhecimento (ato de identificar algo).

Portanto, quando falamos de “símbolo”, estamos falando também de uma espécie de conhecimento analógico, em que se faz o “reconhecimento” de algo, estabelecendo entre duas coisas uma relação ou uma semelhança. E, as duas coisas sobre as quais colocamos o nosso conhecimento analógico são: uma interna e outra externa.

Para deixarmos bem clara esta parte, um símbolo não seria uma mera convenção estabelecida. O símbolo, conforme René Guénon coloca, “é uma pegada do invisível”, é essencialmente “não-humano”, ou seja, criado conforme forças não pertencentes a esta modalidade de existência na qual o ser humano está. Em sendo assim, o símbolo funciona como uma mensagem da eternidade ao homem, como algo que o faz despertar para idéia da filiação a uma origem superior, dita “espiritual” ou “divina”.

Portanto, desta forma, o símbolo seria a metade externa que despertaria no homem o conhecimento da metade interna, já nascida com ele. Enxergando assim, toda a natureza representaria uma mensagem da Divindade ao homem, cabendo a este decifra-la com o conhecimento que se acha guardado em seu coração. E, o que é muito importante, o símbolo funcionaria como fator revitalizante da consciência, tendo em vista seu caráter de produzir no próprio homem a sede de saber a “Verdade”, para através deste conhecimento obter a plenitude.
.....
[1] Francisco da Silveira Bueno – Grande Dicionário Etimológico-Prosódico da Língua Portuguesa – 7.º Volume – Edição Saraiva – São Paulo – 1968.